quinta-feira, 13 de março de 2014

continuando com as impressões de Kabul

Kabul...Impressões...

Kabul...barf miborá...
Meu país tropical não conhece este branco
asséptico, misterioso, mágico...
Inimaginável para minha alma
acostumada a verde e brilho de sol...
e chuva.
De onde sai esta mágica,
que toma conta de tudo,
se impõe a tudo?
A minha alma
fica impregnada de branco
e se veste de gris.
Onde se escondeu a dor e o medo
das crianças e das mães
quando o clarão e o barulho das bombas
invadiam o céu de Kabul,
nestes dias brancos?
O galo cantava?
O muezim chamava para a oração?

Oh Kabul...”barf miborá”...  Kabul-março/2005

sábado, 8 de março de 2014

Kabul, capital do Afeganistão, se situa em um vale entre montanhas muito altas. Estas no seu entorno, sempre nevadas, são o começo do Hindukush, que por sua vez é uma parte dos Himalaias. Quando o avião se prepara para iniciar a descida, ainda sobrevoando as montanhas altíssimas, pontiagudas e brancas, uma ansiedade brota. A proximidade dos cumes é grande e um universo assustador se impõe. Melhor é não olhar para baixo mas a minha natural curiosidade ultrapassa os limites do meu medo e olho. Olho e fico extasiada com aquela paisagem. Me sinto pequenina e limitada. Penso em que tipo de vida transita por aquelas paragens assustadoras sob o ângulo da minha visão. Devagar as montanhas vão passando... vou passando por elas. De repente o vale do rio Kabul e a cidade..., outrora, grande e importante centro cultural, hoje..., calcinada por guerras sucessivas e heroicamente sendo reconstruída. Vistas de cima, as casas se misturam com a cor do solo. A maioria delas, construídas com o barro do lugar, têm a mesma cor da terra. É bonito ver Kabul do alto mas estou ansiosa para andar em suas ruas, conhecer o seu povo e sentir a atmosfera da cidade, que esteve em tantas manchetes, como alvo, na caça mal sucedida a Osama Bin Laden. Ali naquele lugar, os afegãos protegeram, em algum momento, o seu hóspede. Para os afegãos os hóspedes são protegidos até com a própria vida. Com isto não contavam ou disto não sabiam. Mas o concreto é que muitos alvos equivocados foram atingidos. Hospitais, escolas e habitações de civis e muitas pessoas morreram.

Kôbul...
Num dia, já há muito passado, você entrou na minha casa,
por uma carta... Kôbul tinha o povo
mais digno jamais visto.
Assim você entrou na minha casa.
A minha geografia não fora tão longe para trazer você a mim.
Foi a carta.
Imaginei...Kabul...o povo mais digno...Afeganistão.
Tão distante.
Pensei em você mesmo sem lhe conhecer.
Eu nem mesmo sabia direito onde lhe encontrar.
Agora Kôbul...aqui estou
na sua pulsação, no seu coração.
A primeira neve ... O primeiro grande frio.
Da janela vejo um pouco das suas casas, da sua gente...a mais digna.
Eu não sabia como caminhar por suas ruas...tinha medo
de não ser o que você queria de mim.
Envolvi meu corpo com muitos panos...como afghani.  
Tinha frio...Coloquei o tchadór.
Aqueci-me e me encorajei e saí..., tímida.
Não importa.
Decidida.
Queria ver seu rosto perto do meu.
Tive medos.
Meu corpo tropical esfriou.
Mas agora, aquecida e devagar percebo seu sentimento.
Vejo pipas coloridas no céu.
Ouço o muezim chamar para oração
nas suas manhãs e tardes,
do alto dos minaretes das mesquitas envelhecidas.
Apalpo seus muros furados por balaços de canhões.
Tateio seus botões de rosa aguardando o calor,
para florescer.
Acaricio seus animais da rua, suas crianças,
com os olhos.
Sua gente, seus pássaros, suas montanhas, sua neblina,
sua neve, seu sol, sua  destruição e seu renascimento,
com os olhos...
Kôbul...Salâm aleikum...


Kabul/março/2005

Ir pra lá de mim

Andar, voar, mergulhar, transpor espaços,
os rasos, os profundos, perigosos e os nem sei.
Com as pernas, com as asas, os olhos, com a mente,
com os sonhos.
Ousar caminhos desconhecidos e temidos.
Cair de quatro na beira do abismo e saltar.
Atravessar desertos.
Cortar a correnteza dos rios.
Nadar no mar alto.
Não voltar nunca. Ir.